8 de mai. de 2018

AMAZÔNIA: FUNDAMENTOS GEOPOLÍTICOS DA CONQUISTA E DOMINAÇÃO


AMAZÔNIA: FUNDAMENTOS GEOPOLÍTICOS DA CONQUISTA E DOMINAÇÃO 
Prof. Dr. Roberto Monteiro de Oliveira



INTRODUÇÃO - A Amazônia surge no horizonte geográfico da chamada civilização cristã ocidental, ao tempo da expansão colonial europeia.
Expansão colonial europeia é um movimento determinado pela formação do modo de produção capitalista na sua fase concorrencial.
As potências da época disputavam entre si o que ficou conhecido como colônias ultramarinas fornecedoras de matérias primas para as chamadas sedes metropolitanas que transformariam essas matérias primas em produtos para serem consumidos nas sedes metropolitanas entre si e nas colônias. Era o início da globalização e da formação do grande mercado consumidor do capitalismo.
Este movimento implicava na captura e apropriação dos territórios “descobertos” e na dominação de seus habitantes. A ganância pela apropriação de grandes territórios está implícita na possibilidade de maior ocorrência de recursos naturais que pudessem ser transformados em mercadorias.
A competição entre as potências da época determinará a mudança de postura do governo português em relação ao parecer de Pero Vaz de Caminha quando em sua primeira carta ao rei de Portugal após observações preliminares em relação às terras brasileiras afirma: “nelas até agora não podemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro nem lho vimos”.
Quanto às atividades produtivas dos índios, primitivos habitantes do Brasil, Pero Vaz de Caminha verifica que: “eles não lavram nem criam. Não há aqui boi nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha, nem qualquer outra alimária, que costumado seja ao viver dos homens”.
Prosseguindo em suas observações quanto aos indígenas Pero Vaz de Caminha afirma: “Nem comem senão desse inhame que aqui há muito e dessa semente de frutos que a terra e as árvores de si lançam”. Entretanto Pero Vaz de Caminha termina sua carta ao rei de Portugal recomendando: “E que aí não houvesse mais que ter aqui esta pousada para esta navegação de Calicute, bastaria”.
Nesse primeiro momento na percepção dos portugueses o Brasil se mostrava pobre de recursos naturais e com uma população culturalmente atrasada em relação à chamada civilização cristã ocidental. Entretanto, foi considerado um importante apoio geopolítico e geoestratégico para a exploração de outras regiões.
Como parte integrante do Brasil a Amazônia também até meados dos setecentos foi uma região pretendida pelas potências europeias, mas considerada por Portugal uma região selvagem, hostil sem condições de hospitalidade e distante. Entretanto seria interessante manter a posse pelas possibilidades de encontrar ouro, prata, outros metais preciosos e terras férteis.
Será a concorrência mais acirrada entre os estados nacionais que determinará o movimento de colonização dos territórios capturados pelas potências europeias nas chamadas regiões ultramarinas. O Brasil e particularmente a Amazônia sofreu a concorrência e as ameaças da cobiça de franceses, holandeses, ingleses e espanhóis o que levou a coroa portuguesa a iniciar o processo de colonização do Brasil e particularmente da Amazônia. Assim, como o objetivo de afastar os concorrentes no comércio do pau-brasil e na posse de terras potencialmente produtivas é que o governo português resolve preservar a posse exclusiva do Brasil através de ações militares e comerciais, as expedições guarda-costas e colonizadoras.
O PROJETO DA COLONIZAÇÃO – A organização da intervenção econômica das potências europeias nas colônias ultramarinas se deu através de um projeto de colonização. Este projeto de colonização das colônias foi elaborado pela nobreza e outros áulicos palacianos como um processo de dominação, expropriação, captura e exploração das populações nativas e dos recursos naturais existentes em seus territórios.
Na verdade, a Amazônia ao longo de toda a sua história vem realizando em toda sua extensão e compreensão o conceito de colônia elaborado pelos cientistas que se colocaram a serviço do mercantilismo e que vem acompanhando e sofrendo adaptações e atualizações ao longo de toda a sua trajetória histórica e geográfica:

“...as colônias... devem: primeiro dar a metrópole um maior mercado para seus produtos; segundo, dar ocupação a um maior número dos seus (da metrópole) manufatureiros, artesão e marinheiros; terceiro, fornecer-lhe uma maior quantidade dos artigos de que precisa”. (HENRI, See, As origens do capitalismo moderno.. In: NOVAIS, Fernando. 1981, p. 59).
Como nas outras regiões dominadas pelos europeus, a produção colonial na Amazônia, se deu inicialmente, com a adoção do trabalho escravo dos indígenas e posteriormente com a introdução dos africanos também na condição de escravos.
Com a abundância de terras ainda não privatizadas era impossível evitar a fuga dos indígenas para outras regiões para darem continuidade ao seu modo de vida. Os índios adotam como forma de resistência a clássica retirada estratégica para áreas a salvo das investidas do inimigo.
Dessa forma muitas nações indígenas conseguiram resistir até hoje. São aquelas nações indígenas que a literatura própria as denomina de índios arredios, semiaculturados, semicivilizados e outras denominações pejorativas que só denunciam preconceito, discriminação e desrespeito contra as nações indígenas. As nações indígenas que optaram pelo enfrentamento foram simplesmente massacradas.
Pelo mesmo motivo, abundância de terras ainda não privatizadas era muito difícil, quase impossível, impedir que trabalhadores assalariados livres, vindos da Europa, invadissem essas terras devolutas para constituírem uma economia de subsistência voltada para seus próprios interesses e necessidades.
Essas circunstâncias objetivas põem para os colonizadores a questão da mão-de-obra. Quem vai trabalhar? A opção escolhida pelos portugueses foi a integração das nações indígenas à sociedade cristã ocidental.
Os índios e as índias passam a fazer parte da civilização cristã ocidental na condição de “descidos” e de “escravos“. Descidos na verdade foram os índios que persuadidos pelos missionários e escoltados pelas tropas portuguesas desciam de suas malocas para trabalharem nas “aldeias de repartição” onde ficavam sob o controle do “capitão de aldeia” e eram “repartidos” entre as ordens religiosas, entre os colonos portugueses e entre as instituições da coroa.
As “tropas de resgates” capturavam os índios, homens, mulheres, crianças e idosos e os levavam para os mercados de escravos onde eram adquiridos pelos colonos, pelos religiosos e pelos funcionários do governo português, na sede da província, Belém.
Índios escravos foram na terminologia dos portugueses aqueles índios escravizados através dos “resgates”. Aqui, ao contrário dos “descimentos”, a iniciativa era das “tropas de resgates” que legitimadas pelos religiosos missionários promoviam “as guerras justas”.
Outra modalidade de atuação das tropas de resgate era trocar os índios capturados nas guerras intertribais e que seriam sacrificados por quaisquer objetos de interesse de seus detentores. Esses índios eram encaminhados para serem vendidos nos mercados de escravos em Belém.
Nessas condições de extrema inferioridade e completamente desumanizados, os índios, e as índias passam a fazer parte desse novo ordenamento geo-social, conhecido como civilização cristã ocidental.
Nunca será demais, afirmarmos que é necessário resgatar e destacar na formação territorial do Estado Brasileiro, o papel primordial e fundamental das nações indígenas. Particularmente no norte do Brasil foram as nações indígenas que contraditoriamente apontaram os caminhos da conquista. Remaram, pescaram, caçaram para alimentar seus conquistadores. Foram as nações indígenas que com sua robustez física enfrentaram o calor equatorial e com o suor de seu trabalho construíram igrejas, capelas, catedrais, palácios, colégios, fortes, portos e etc., e asseguraram a posse da Amazônia para o Brasil.
CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO COLONIAL NA AMAZÔNIA - A produção colonial na Amazônia seguindo as formulações do projeto de colonização para todas as regiões a serem colonizadas será organizada considerando as suas condições geográficas intertropicais como prolongamento e complementação da economia das metrópoles situadas nas regiões temperadas assumindo características próprias.
Uma destas características é apontada por Caio Prado Júnior em sua obra História Econômica do Brasil quando afirma que na Amazônia: “a exploração se realiza indiferentemente na floresta imensa aberta a todos” (grifos nossos). Aqui está o fator que vai diferenciar a colonização da Amazônia da colonização do Brasil. Por conta desse fator aqui na Amazônia inicialmente não há condições para a formação de latifúndios nem para a implantação de monoculturas, as plantations: “a exploração se realiza indiferentemente na floresta imensa aberta a todos”. É uma produção extrativa que exige relativo investimento.
Ainda segundo Caio Prado Júnior as atividades econômicas dependem da oferta de produtos da floresta, dos rios e lagos conforme suas situações e modificações do seu próprio clima no decorrer do ano: “e faz-se esporádica, coincidindo com as épocas próprias da colheita, processa-se por arrancos bruscos, que são as “expedições” (é o nome empregado) que saem no momento oportuno em busca dos produtos naturais e a que se segue a longa inatividade da estação morta”. (grifos nossos).
Na verdade, o projeto de colonização portuguesa na Amazônia considerando as condições geográficas intertropicais e a condição econômica e política de Portugal terá também esta característica que marcará a economia local até os dias atuais. Portugal optou pelo extrativismo. As atividades extrativas restringem-se a circulação de mercadorias sem grandes investimentos na produção.
Uma outra característica do projeto colonial decorre da exigência de resguardar com exclusividade as regiões coloniais e manter com elas o monopólio do comércio, o que ficou conhecido como o exclusivismo colonial. Este monopólio permite à metrópole minimizar os custos de produção dos produtos coloniais e impor preços aos produtos finais.
Assim, a venda desses produtos na sede metropolitana ou em outras metrópoles só beneficiou a burguesia mercantil metropolitana que se apropria das rendas das populações das colônias, das rendas das populações das sedes metropolitanas e das rendas das populações das outras metrópoles.
De igual modo, a compra de produtos para consumo nas colônias a preço de mercado nas outras metrópoles e sua revenda para as colônias a preços monopolistas só possibilitou lucros para a burguesia metropolitana.
Assim o projeto de colonização estabelece relações altamente vantajosas para as metrópoles e altamente prejudiciais às colônias, iniciando o processo de enriquecimento das metrópoles europeias à custa do empobrecimento cada vez maior das colônias ultramarinas.
Consequência direta do exclusivismo colonial é resguardar a posse, o uso e usufruto dos recursos naturais e humanos existentes nas regiões descobertas e capturadas. Daí a necessidade da construção de estruturas militares para defesa das fronteiras e limites e a exploração do território com exclusividade.
Uma outra característica do projeto colonizador é que a produção das colônias se organize dentro das condições geográficas intertropicais como prolongamento e complementação da economia das metrópoles situadas nas áreas temperadas.
As colônias situadas nas regiões intertropicais colocam-se como regiões complementares da economia das metrópoles situadas nas regiões temperadas, produzirão aquilo que as metrópoles determinarem.
É nesse sentido que na Amazônia, inicialmente, a produção colonial será baseada no extrativismo, daquilo que ficou conhecido como Drogas do Sertão.
As Drogas do Sertão, na verdade, têm uma compreensão e extensão bem maior daquilo que a historiografia tradicional passou para a grande maioria. Trata-se de uma variedade de produtos coletados pelos índios na floresta nos lagos e nos rios através da caça e pesca e de outras atividades produtivas que serão utilizados pelos europeus na tinturaria, na construção naval, na medicina, na alimentação, cordoaria, perfumaria e etc.
As madeiras e os produtos do reino animal, a salsaparrilha, a canela, o cacau, o cravo, a piaçaba, a castanha-do-pará, a baunilha, sementes oleaginosas, pixurim, tinta do urucum e etc., serão transformados em mercadorias para serem comercializadas com os outros países.
Complementando todas essas exigências da obra colonizadora dos europeus nos trópicos, no além-mar, cria-se também um princípio ético que orientará as ações dos europeus no relacionamento com a natureza e com as populações das colônias e que será usado e abusado pelos empreendedores aqui na Amazônia: “Ultra aequinotialem non peccatur”. (Não se comete pecado nas regiões do equador).
A partir deste princípio ético não tem mais o que se discutir. Os empreendedores para obter lucros e sucesso, para serem empreendedores bem-sucedidos na Amazônia podem depredar a natureza, escravizar os índios, abusar das índias, invadir e expulsar os índios de suas terras e etc..... Esta será a marca indelével que acompanhará toda a História e a Geografia da Amazônia: ser uma região colonial.
Nesta linha de princípios, não satisfeitos com os princípios éticos teóricos visando facilitar ainda mais a ação dos dominadores, os idealizadores do projeto colonial recuperam, desenvolvem e aplicam aos nativos da Amazônia o conceito de guerra justa.
A QUESTÃO DA GUERRA JUSTA - A violência cometida contra as nações indígenas está implícita na lógica da concorrência capitalista. O Estado monárquico português não poderia se estabelecer na Amazônia sem o afastamento dos concorrentes europeus, ingleses, holandeses e franceses, os inimigos externos e sem a destruição dos inimigos internos, as nações indígenas resistentes à dominação.
São dois projetos de vida antagônicos: (In)Feliz Lusitânia dos portugueses versus Araquiçawa, a terra sem males dos tupinambá. Assim, uma vez estabelecidos em Belém os portugueses iniciam a matança dos índios.
A banalização da violência contra as nações indígenas no processo de formação territorial da Amazônia tem os seus fundamentos teológicos. Na civilização judaico-cristã temos explicitamente a condenação da violência. Os livros sagrados condenam explicitamente a violência, entretanto os doutrinadores, os chamados Doutores da Igreja Católica relativizam os ensinamentos sagrados. Javé condenou severamente o crime fratricida de Cain contra seu irmão Abel dando-lhe uma severa penalidade. No quinto mandamento está bem explícito e claro “Não Matarás”.
Segundo a exegese tradicional esta ordem inclui todas as formas de morte que os homens infligem uns aos outros, desde a morte lenta das torturas físicas e mentais até a morte cruenta dos homicídios e genocídios e bombardeios. Ou seja, as Escrituras Sagradas condenam todas as formas de violência.
Assim no Antigo Testamento os profetas de Israel denunciaram todas as formas de injustiça usadas como instrumento de violência contra os humildes, os pobres e os estrangeiros, os órfãos e as viúvas. Denunciaram as injustiças e anunciavam um reino de paz e reconciliação, no qual as espadas se transformariam em arados, as armas de violência em instrumentos de paz e prosperidade. Isaías no capítulo 32, versículo 17 afirma com bastante veemência: “O fruto da justiça é a paz”.
No Novo Testamento, Jesus Cristo proclama bem-aventurados os mansos, os construtores da paz, os misericordiosos e os que têm fome e sede de justiça. Jesus Cristo prega uma doutrina revolucionária que anuncia um novo mandamento, o mandamento do amor, que ultrapassa as exigências do legal e do justo e chega ao extremo de propor o perdão das ofensas e o amor aos inimigos.
Na Amazônia, porém, os enviados da Ordem de Cristo renegaram toda essa doutrina e enveredaram pelas leis do enriquecimento rápido e fácil e a qualquer custo. Esqueceram os mandamentos do Cristo “amai-vos uns aos outros” e seguiram os conselhos de Maquiavel de “que é melhor ser temido do que amado ... e que não deve importar ao príncipe a qualificação de cruel para manter os seus súditos unidos e com fé”. É nesse sentido que se retoma o conceito de Guerra Justa aqui na Amazônia.
O conceito de Guerra Justa tem longa tradição na teologia católica. Tertuliano afirmava que a guerra era tão nobre quanto a navegação, a agricultura e o comércio. Santo Ambrósio considerava a força guerreira como uma virtude. São Bernardo, o Doutor Melífluo, ensinava que a guerra era legítima e meritória. Também os doutrinadores cristãos que escreveram em grego – doutores da patrologia grega - a guerra é legítima desde que feita pela autoridade pública.
Para Santo Agostinho a guerra é uma extensão do ato de governar. Além disso, Santo Agostinho estabeleceu cinco condições para que uma guerra seja considerada justa: 1. A intenção deverá ser sempre a de restabelecer a paz; 2. O objetivo deverá ser sempre a de restabelecer a justiça; 3. A guerra deve ser acompanhada de uma disposição interior de amor cristão entre as partes; 4. A guerra só deve ser empreendida sob a autoridade de um soberano legítimo; 5. A conduta da guerra deve ser justa.
São Tomás de Aquino na Suma Teológica também apresenta as condições para justificar uma guerra. “Em primeiro lugar, a autoridade do Príncipe que tem mandato para ordenar que se faça a guerra”. Prosseguindo afirma: “uma guerra justa deve ser feita por uma causa justa, ou seja, é preciso que aqueles que se atacam mereçam pela sua culpa serem atacados”. Por fim são Tomás conclui: “... os que fazem uma guerra perseguem a paz”.
Observamos que a legitimação da guerra justa é inicialmente feita pelos teólogos. Somente a partir do século XVI, com Maquiavel que defendia a ideia de que a necessidade transforma uma guerra em justa é que a guerra se desvincula da teologia e passa para o campo do direito e dos cientistas que se colocam a serviço do poder estabelecido.
Concretamente, podemos concluir que historicamente as potências hegemônicas, através de seus ideólogos, sempre encontraram e ditaram as razões para impor seus interesses causando enormes sofrimentos aos povos e danos irreparáveis à natureza promovendo guerras de conquistas.
Verificando as razões das guerras movidas contra as nações indígenas amazônicas não encontramos nenhuma legitimação teológica ou jurídica. De qualquer forma o Bispo de Chiapas Bartolomeu de las Casas doutrinava “... toda a intervenção armada provoca mais pecados e destruição do que as ofensas que trata de eliminar... pregar o Evangelho na ponta da espada é uma heresia digna de Maomé”.
Na verdade, à luz dos doutrinadores católicos podemos considerar as guerras movidas contra as nações indígenas amazônicas como um pecado mortal gravíssimo, pois que se trata simplesmente da maior invasão territorial seguida do maior genocídio praticado pelos portugueses que ainda hoje clama por justiça e remissão humanitária desses povos.
Assim sendo, pode o governo português legitimar as guerras de extermínio das nações indígenas amazônicas que se opunham à sua dominação e colocar as bases para a formação e desenvolvimento da sociedade atual.
Sintetizando as práticas de violência cometidas contra as nações indígenas pelas autoridades portuguesas no processo de colonização da Amazônia o historiador José Valente, na sua coluna "Hoje na vida do Pará", nos relata o seguinte:

 "1740. O livro "Brasil, Colômbia e Guianas", de Ferdinand Denis, enumera os mais sanguinários governadores, capitães mores e capitães que passaram pela capitania do Grão-Pará. Foram os seguintes: capitão-mor Francisco Caldeira Castelo  Branco – tinha o mórbido prazer de passar o fio da espada pela goela de inermes índios, principalmente de mulheres e crianças; capitão-mor Bento Maciel Parente – seus "olhos brilhavam de estranho prazer quando o índio esperneava na ponta de uma corda"; capitão-mor Jerônimo Fragoso de Albuquerque – fidalgo da casa real (imagine se não fosse) extinguiu as tabas aborígines, de modo impiedoso, dos índios Iguapé, Guanapu e Caripi, nos arredores de Belém. Mandava fazer enormes montes de lenha e os sobreviventes eram queimados vivos. Fragoso de Albuquerque "sentia enorme prazer em aspirar o cheiro acre da carne queimada"; os capitães Pedro Maciel Parente e Vital Maciel Parente, sobrinhos do capitão Bento Maciel Parente, "gostavam de ouvir o som cavo da borduna, na cabeça do pobre índio"; capitão-mor Manoel de Sousa de Eça matava o aborígine com um fino fio de cobre, fazendo torniquete em seu pescoço; capitão-mor Luiz do Rego Barros os eviscerava. Esses foram os que mais se destacaram no extermínio de um povo: não que os demais capitães não os matassem, mas o faziam rapidamente ("humanamente", segundo eles)". (Cf. VALENTE, José. Hoje na vida do Pará. O Liberal. Cartaz, Belém, p. 7, 28 mar. 1999).

Esses fatos parecem distantes no espaço/tempo, entretanto a presença dos índios ainda incomoda os governantes do Estado Brasileiro. Os grandes projetos do Estado Brasileiro ainda se deparam com as tribos indígenas resistentes: as estradas, as hidrelétricas, os projetos agrominerais, a exploração das madeiras e dos fármacos etc. etc.…
A crueldade contra a presença dos índios continua a mesma. O episódio do líder indígena pataxó Galdino Jesus dos Santos que foi queimado vivo em Brasília, após participar de manifestações do Dia do Índio é muito expressivo da violência que ainda se comete contra os índios no Brasil.
Estabelecidas as exigências e enunciados os princípios de ação prática inicia-se o processo de integração dos amazônidas à sociedade cristã ocidental através de projetos de colonização da Amazônia.
Neste processo, a construção das estruturas militares é a expressão no território da estrutura da sociedade regional que se iniciava a construir na Amazônia. A paisagem geográfica indígena primitiva é destruída e reconstruída em função de novos interesses. “Queima-se a ‘tapera dos Manaus’ para construir a ‘Paris dos Trópicos’ ou a ‘Miami brasileira’. Este será o padrão de comportamento da expansão da sociedade da livre iniciativa e da livre concorrência no mundo. Destrói-se o que está estabelecido pelas populações nativas e reconstrói-se em função dos interesses dos dominadores.
A floresta, os rios e lagos passam a receber novas edificações completamente alheias à cultura das nações indígenas e de suas necessidades e interesses: igrejas, conventos, fortes, fortalezas, quarteis, portos e etc., são construídos para atender interesses bem diferentes e distantes dos interesses dos nativos.
Na verdade, não são apenas estruturas militares, mas é todo, um conjunto de edificações e princípios éticos que são estabelecidos para atender as exigências do funcionamento de uma nova organização socioeconômica que se começava a construir.
Dando cumprimento a esta ordem o próprio governador Joaquim de Mello e Póvoas, em suas viagens deu novos nomes para antigas aldeias indígenas:

“...fui antigua Aldeia doz Abacaxiz aqual está mudada pa Itacutiara, ...e a Eregi emnova Va de Serpa,...” “Passey também a antigua Aldea de Saraca, e a eregy em nova Villa de Silvez,... “e mandei o Capitão Engenheiro  “riscar a Situação da Praçaz, e ... Cazaz detodos os Moradorez”. “Segundo as Ordens de S. Mage ...Eregi em Villa de Ega esta, Aldea de Thaphé...”
“O Lugar de Alvaraes achey... muito bom, ... com os Dessimentos ... “tenho”... esperancas, q. venha a Ser hua grande Povoação”. “...achei novamente mudado oLugar de Fonteboa, enão gostey nada daa Situação emq. Estava...”
Na aqntigua Aldeya de S Paullo criey anova Va de Olivença, também nesta Va não achey Farinhas;...”
“...cheguey ao Javary, e... medesconsolou muito omau Sítio emq. Está estabelecida aquella Povoação, ... e criey anova Villa de S. Jozé do Javary,...”
“Estez Moradores também não uzão de Farinha, nem ... Macaxeira; ... Sustentandose de frutaz do mato, epacovas aSadas q. ... Serve depão”. (Universidade do Amazonas. CEDEAM. Cartas da Primeiro Governador da Capitania de São José do Rio Negro, Joaquim de Mello e Póvoas (1758-1761). p. 33).

Admite-se que o idioma de um povo é um dos elementos constituintes de sua própria identidade e naturalidade. Expropriado de sua própria língua um povo perde sua identidade, pois perde o seu instrumento principal de comunicação coletiva. Nesse sentido Pierre Bourdieu afirma: “o que fala nunca é a palavra, mas toda pessoa social”.
A espoliação capitalista não se contenta em expropriar a cultura material dos povos mas arranca-lhes seus traços psicológicos de expressar a sua identidade e impõe-lhes com o discurso do desenvolvimento, do moderno, do avaçado as suas práticas nefastas desqualificando valores, conhecimentos e a sabedoria tradicional  dos povos. O idioma, as artes, a música, as manifestações folclóricas enfim toda a cultura dos povos são desqualificadas e impostas novas manifestações ao gosto dos dominadores.
Impedir um povo de expressar o que pensa através de seu próprio idioma, impedir um povo de construir e exprimir seus raciocínios de acordo com as regras gramaticais de sua própria língua é a tortura mais execrável que se pode cometer contra um povo pois que cruelmente mutila a pessoa de sua prória razão e a emudece para sempre.
Os indígenas do Brasil e da Amazônia foram impedidos de escrever a própria história e com isso perderam a memória coletiva de seu passado criando condições para serem tutelados o que lhes tem impedido de assumir e programar o próprio futuro.
A colonização portuguesa no Brasil e na Amazônia foi um processo conflituoso que envolveu a interação e a comunicação do Estado português plenamente instituído em Lisboa e com seus prepostos nas colônias, e as nações indígenas amazônicas iniciando seu processo de desenvolvimento e integração à sociedade capitalista, ainda no estágio de tribos isoladas e independentes aqui na Amazônia.
Na verdade, na Amazônia foi negado às nações indígenas o direito humano fundamental e indisponível ao desenvolvimento. São nações abortadas pela civilização cristã ocidental que lhes negou desde os primórdios de sua gestação o direito à autodeterminação dos povos. Na Amazônia o Estado precede a Nação.
O primeiro governador Mello e Póvoas foi sintético e categórico;

 “O meyo mais eficaz e prompto para Seintroduzir nos habitantes desta Capitania a civilização deque tanto carecem hé o Cazarem os Soldados Com as índias[...] e a frequencia das escolas emque aprendem os pequenos não Só a ler, escrever, e contar, mas tão bem a Língua portuguesa; ...” Sendo igualmente necessário para o augmento destes Povos, o fazerem as plantaçoens de Algodão, ... de Manibas ... o negócio, e Colheyta do Cacao, ...” (Universidade do Amazonas. CEDEAM. Cartas da Primeiro Governador da Capitania de São José do Rio Negro, Joaquim de Mello e Póvoas (1758-1761). p. 34).

No aspecto mais amplo da comunicação humana, as ordens das autoridades portuguesas emitidas de Lisboa principalmente através de cartas régias, no sentido de orientar a política do projeto de colonização da Amazônia sofriam interpretações e adequações por parte das autoridades coloniais quando de suas execuções, o que provocou mal-entendidos, equívocos, confusões, desentendimentos, altercações, intrigas e brigas entre funcionários metropolitanos e coloniais como entre missionários, colonos e funcionários aqui na colônia.
Na verdade este é um problema recorrente, todas as vezes que os Governos procuraram intervir na Amazônia e que remonta ao primeiro diálogo dos descobridores do Brasil com os nativos conforme relata Pero Vaz de Caminha: “Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, (o grifo é nosso), por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio”.
Em uma longa entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, no CMA em Manaus, publicada em 22 de outubro de 2013 o General Eduardo Villas Boas, comandante militar da Amazônia e posteriormente comandante do Exército Brasileiro respondendo questões a respeito dos problemas da Amazônia atualiza essa questão da comunicação entre as autoridades do poder central e suas bases aqui na Amazônia.
Perguntado pelo jornalista da Folha de São Paulo: “- Quais são as principais necessidades da população local?”o General Villas Boas respondeu: “As reais necessidades da população da Amazônia chegam ao centro-sul de maneira distorcida. Com isso, monta-se uma base de conhecimento desfocada, com soluções não apropriadas”. Prosseguindo em sua resposta afirma o General Villas Boas: “A população, principalmente no interior, não tem necessidades básicas atingidas. Em grande parte, não há nenhuma presença do governo do Estado. Em algumas áreas as Forças Armadas são essa única presença”.
Em outro trecho da entrevista o repórter perguntou ao General Villas Boas: “Brasília sabe o que acontece na Amazônia? ” Ao que o General Villas Boas replicou: – “Na parte da defesa até sabe. O que ocorre é que, em pleno século 21, o país não completou sua expansão interna. Temos metade do nosso território a ser ocupado, integrado à dinâmica da sociedade”. Concluindo sua resposta afirmou o General Villas Boas: “A Amazônia, como não está integrada ao país, não há conhecimento no Sul da sua realidade, seu potencial. É como se fosse uma colônia do Brasil. Ela não é analisada, interpretada, estudada e compreendida numa visão centrada da própria Amazônia. Isso nos coloca numa posição periférica”.
A partir do momento em que as autoridades portuguesas tomam conhecimento de que a Amazônia não era uma região desconhecida pois franceses, ingleses, holandeses e espanhóis já a conheciam e ameaçavam conquistá-la e que também a Amazônia não era uma região vazia pois já era habitada por inumeráveis nações indígenas o Governo Português inicia o projeto de sua colonização.

O PROCESSO DE DOMINAÇÃO E COLONIZAÇÃO DA AMAZÕNIA. A CONSTRUÇÃO DO FORTE DO PRESÉPIO - BELÉM - Como uma região colonial periférica a Amazônia passa a fazer parte da civilização cristão ocidental no momento em que a sociedade capitalista está vivendo sua fase concorrencial, o que exigia o exclusivismo comercial.
Para preservar o exclusivismo comercial era necessário preservar a posse dos territórios descobertos e proteger as edificações construídas. Para isso foram construídos os fortes, fortalezas, quartéis, conventos, igrejas e etc...
Para iniciar o processo de conquista definitiva da Amazônia aos doze dias do mês de janeiro do ano da graça de mil seiscentos e dezesseis (1616), com a proteção de Nossa senhora da Graça, o capitão Francisco Caldeira Castelo Branco lançou as bases do fortim que iniciava a construção da cidade que se chamou Feliz Lusitânia. O forte chamou-se presépio, e no seu interior foi construída uma capela para o culto de sua guardiã, Nossa Senhora da Graça.
Belém, pela sua posição estratégica transforma-se no baluarte para o enfrentamento dos inimigos esternos franceses, ingleses e holandeses e também dos inimigos internos as nações indígenas. Ao final das lutas entre os primitivos habitantes, os Tupinambá e Pacajá, e os conquistadores portugueses, depois de afastados os concorrentes holandeses, franceses e ingleses, a “Feliz Lusitânia” se transformara e já era conhecida como Nossa Senhora de Belém do Grão-Pará. Posteriormente, foi chamada de Santa Maria de Belém. Na atualidade, é simplesmente Belém. Belém do Pará.
A partir do forte, Belém começa a crescer em direção ao norte, as ruas foram sendo construídas paralelamente ao rio. O interior foi sendo conquistado e ocupado por caminhos transversais. No lado norte, os conquistadores foram construindo suas casas de taipa, dando origem ao que hoje conhecemos como Cidade Velha. Para o lado sul, dirigiram-se os Capuchos de Santos Antônio, onde às margens do Paraná-Guaçu construíram o “Hospício” do Una.
Ainda na parte norte, saía o igarapé Piry, que ia desaguar perto do forte, nas imediações da doca do Ver-o-Peso. O Arsenal da Marinha foi construído lá pelas cabeceiras do igarapé Piry. No local onde Bento Maciel possuía uma residência, foram construídos o Convento e a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, pelos carmelitas calçados. Atualmente, os salesianos de Dom Bosco mantêm bravamente nesse local,  o tradicional Colégio do Carmo para a educação cristã da juventude.
Essas informações são necessárias para reforçar a tese de que na verdade, não são apenas estruturas militares, mas é todo, um conjunto de edificações e procedimentos para pôr em funcionamento uma nova organização socioeconômica que se começava a construir.
Para alguns historiadores a afirmação explícita da Amazônia como região de brasileiros se dá a partir de 1614, quando os luso-brasileiros, na sua maioria indígenas, expulsam os franceses que tentaram apoderar-se do Maranhão e em seguida constroem o forte do presépio, sob cuja proteção se iniciaria o processo de integração da Amazônia ao incipiente modo de produção capitalista. Estes fatos estão na gênese de todo um sentimento de brasilidade que estava se formando na mente e nos corações daqueles que habitavam estas terras.

O PROCESSO DE DOMINAÇÃO E COLONIZAÇÃO DA AMAZÕNIA. A CONSTRUÇÃO DO FORTE DE SÃO JOSÉ DA BARRA DO RIO NEGRO – MANAUS. Para consolidar o processo da conquista definitiva da Amazônia e preservar a posse luso-brasileira, sobretudo da Amazônia Ocidental foi fundamental a construção do Forte de São José da Barra do Rio Negro.
A região do Rio Negro desde os primeiros contatos com os europeus foi considerada uma região estratégica.
A partir da expedição de Francisco de Orellana em 1542, frei Gaspar de Carvajal, capelão da expedição referiu-se ao Rio Iquiari com o nome de Rio Negro que ficou até os dias atuais. Vejamos a seguir como Frei Gaspar de Carvajal descreve a “descoberta” do Rio Negro em sua obra "Relación del descubrimiento del famoso río Grande que dese su nacimiento hasta el mar descubrió el Capitán Orellana en unión 56 hombres":

No sábado, véspera da Santíssima Trindade, mandou o Capitão fundear em uma povoação onde os índios se puzeram em defesa. Apesar disso os expulsámos de casa e nos provimos de comida, achando ainda algumas galinhas. Nesse mesmo dia, saindo d’ali, prosseguindo a nossa viagem, vimos uma boca de outro grande rio, à mão esquerda, que entrava no que navegávamos, e de água negra como tinta, e por isso lhe puzemos o nome de Rio Negro. Corria ele tanto e com tal ferocidade que em mais de vinte léguas fazia uma faixa na outra água, sem misturar-se com a mesma. Ainda nesse dia vimos outras povoações não muito grandes. No domingo da Santíssima Trindade descansou o Capitão com a sua gente nos pesqueiros de um povoado que estava numa lomba, encontrando-se aí muito peixe, que foi socorro e grande alegria para os nossos espanhóis, pois havia dias que não descansávamos. Estava esta povoação situada em uma lomba afastada do rio, como em fronteira de outros povos que lhe faziam guerra, pois estava fortificada por uma muralha de grossos troncos. Quando os nossos companheiros subiram para tomar comida, os índios a quizeram defender e se fizeram fortes dentro daquela cerca, que não tinha mais de uma porta, havendo-se com bravura. Mas como nos víamos em necessidade, resolvemos atacá-los e, nessa determinação acometemos pela dita porta, entrando sem nenhum risco. Os companheiros pelejaram com os índios até desbaratá-los e logo recolheram a comida, que havia em quantidade. (Gaspar de Carvajal, Alonso de Rojas, Cristóbal de Acuña. Descobrimentos do Rio das Amazonas. [1981], p. 50,51).

Excedendo os limites territoriais de suas observações e ultrapassando a visão dos acontecimentos do momento, o capelão da expedição de Pedro Teixeira frei Cristóbal de Acuña percebeu em 1639 que o território dominado pelos Manaus era uma área estratégica para proteger e defender a Amazônia da cobiça dos concorrentes holandeses e ingleses que estavam ao norte dessa região e que desejavam descer para participar dos empreendimentos que se realizavam naquele território com as várias nações indígenas.
A esse tempo o rio Iquiari era também conhecido como o Rio do Ouro e nas proximidades dessa região estaria o país do El Dorado e a Cidade de Manoa próxima ao lago Parima, onde se dizia haver grande quantidade de ouro de tal modo que os guerreiros vencedores eram premiados com um banho de ouro em pó sobre seus corpos nus.
Segundo observações de missionários e de outros viajantes que passaram por esse território a partir da segunda metade do século XVII havia um comércio intenso praticado pelas nações indígenas com estrangeiros, sobretudo com os holandeses.
Essa área de livre comércio liderada pelos Manaus abrangeria o território das antigas guianas (holandesa e inglesa) delimitada informalmente desde o Rio Orenoco até a região do Rio Madeira.
Observam os cronistas dessa época que os indígenas não queriam mais negociar com os portugueses porque as mercadorias e quinquilharias ofertadas pelos holandeses e ingleses eram bem melhores.
Fica evidente que esse quadro de eventos, fatos e descrições fantasiosas despertava nas pessoas sentimentos de enriquecimento rápido e fácil e de qualquer jeito atraindo para a região aventureiros de todas as espécies. É claro que os colonos portugueses não poderiam deixar de participar desses negócios e sobretudo o rei de Portugal não poderia deixar de arrecadar impostos para a Fazenda Real.
Explicitando mais ainda fica evidente também que essa área de livre comércio liderada pelos Manaus passa a ser uma área estratégica para a defesa do território, controle das atividades econômicas enfim para o resguardo do exclusivismo colonial em relação à Amazônia e especialmente do Rio Negro.
Particularmente os holandeses não desistiam de marcar presença no Brasil e na Amazônia. Aqui na Amazônia os holandeses instalaram um forte no estuário do Rio Essequibo e em 1621 fundaram a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.
Essa companhia passa atuar na região criando sua rede de colaboradores corrompendo os chefes das nações indígenas nesse escambo hediondo de índios e negros escravizados por quinquilharias, armas e outras mercadorias.
Os Manaus combateram a nação indígena dos Karinya e dos Akawaio que fizeram parte da rede de colaboradores dos holandeses, por esse motivo, em 1724 o Conselho Político de Essequibo ordena o extermínio dos Manaus e que os prisioneiros fossem vendidos como escravos. O Conselho Político de Essequibo premiava quem matasse um manaus.
Ajuricaba e seus guerreiros manaus lideraram uma coalisão de chefes de nações indígenas no enfrentamento à invasão e ocupação de seus territórios, no saque aos seus recursos naturais e na redução das populações indígenas à condição de escravos.
Todos esses fatos contrariavam os interesses do Rei de Portugal e particularmente os interesses imediatos dos colonos portugueses aqui na Amazônia.
Os colonos portugueses irritados com os índios e incapazes de dar combate aos seus verdadeiros inimigos e concorrentes os holandeses, ingleses, franceses e espanhóis na disputa pela força de trabalho dos índios e pelos recursos da floresta conseguiram do Conselho das Missões autorização para fazer uma “guerra justa” contra os manaus e seus aliados.
O motivo para fazer “guerra justa” contra os Manaus foi a acusação de que Ajuricaba seria aliado dos holandeses e que navegava pelos rios ostentando a bandeira da Holanda. Já vimos anteriormente que os manaus não tinham nenhuma razão para se aliarem aos holandeses o que não impediria de esporadicamente fazer algum negócio com algum holandês. O fato é que o Conselho das Missões votou pela autorização da “Guerra Justa” contra os manaus e seus aliados e a captura de Ajuricaba.
Legitimados pelo Conselho das Missões e munidos de todos os recursos necessários o governador João Maya da Gama recomenda ao capitão João Paes do Amaral uma “guerra dura”.
Na verdade, esta operação bélica contra os manaus ocorreu em setembro de 1727, em uma localidade conhecida na época como Ponta do Azabari, nas proximidades do encontro das águas do Rio Negro com o Rio Amazonas.
Ajuricaba viu seu filho Cucunaca ser assassinado pelos portugueses durante os combates. Juntamente com Ajuricaba foram mortos os caciques: Aguaru, Canacury, Cany, Caramery, Daã, Gaau, Juabay, Majury, Manatuba, Mandary e mais duzentos índios que seguiriam acorrentados para serem devidamente justiçados em Belém.
Logo no início da sinistra viagem Ajuricaba rebelou-se contra seus algozes no que foi seguido pelos seus companheiros resultando na morte de todos esses guerreiros Amazônidas conforme relato do governador Maia da Gama:

"Quando Ajuricaba estava vindo como prisioneiro para a cidade de Belém, e ainda estava navegando no rio, ele e outros homens levantaram-se na canoa onde estavam sendo conduzidos agrilhoados e tentaram matar os soldados. Estes sacaram de suas armas e feriram alguns deles e mataram outros. Então, Ajuricaba saltou da canoa para a água com um outro chefe e jamais reapareceu vivo ou morto. Deixando de lado o sentimento pela perdição de sua alma, ele nos fez uma grande gentileza libertando-nos dos temores de sermos obrigado a guardá-lo".

Fica claro que Ajuricaba cacique dos manaós e todos os outros dez caciques das tribos aliadas lutaram até a morte na defesa de seus territórios. Houve luta, e luta heroica. Mesmo acorrentados Ajuricaba e seus guerreiros manaus não se acovardaram e lutaram contra os soldados portugueses sobretudo na defesa dos eternos valores inscritos na mente, no coração, no peito e na vontade de todos os povos: liberdade e autodeterminação.
O rei de Portugal Dom João V agradeceu ao governador do Pará João Maya da Gama pelos bons e leais serviços prestados à coroa portuguesa pelo extermínio de Ajuricaba e dos outros dez caciques de tribos aliadas.
A partir dessa matança dos chefes e mais duzentos guerreiros foi eliminado o fator manaós, a tribo líder do Rio Negro, ficando mais fácil o trabalho de buscar e escravizar os índios pelos colonos portugueses. Na verdade, essa matança dos manaus e de outras nações indígenas na Amazônia é mais um crime de lesa-humanidade que até hoje clama por justiça.
A construção da região amazônica resulta, portanto do embate de dois projetos de vida: FELIZ LUSITÂNIA dos portugueses e A TERRA SEM MALES dos indígenas amazônidas, idênticos nas suas concepções pois, ambos buscavam a felicidade, mas completamente diferentes nas práticas e procedimentos para a consecução de seus objetivos.
O fato é que a região do Rio Negro foi considerada estratégica para a defesa do território e será nas proximidades de sua foz com o Rio Amazonas que será construído o forte de São José da Barra do Rio Negro.
Por ordem do Governador e Capitão Mor do Pará Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, a partir de 1669 o Capitão Pedro da Costa Favela dá início a construção da lendária Fortaleza de São José da Barra do Rio Negro disposta em uma área onde as nações indígenas enterravam seus mortos.
Manaus começa a ser construída e se desenvolve em cima de cemitérios das nações indígenas que em vários momentos de sua expansão ressurgem do âmago de seus territórios lembrando às gerações atuais as suas raízes e os embates com os colonizadores. Assim é que surge a Praça da Saudade, a Praça da Polícia, a Cidade Nova e etc....
A partir da fortaleza construíram-se edificações que resultaram na formação do “Lugar da Barra”, que posteriormente seria a sede da Comarca de São José do Rio Negro.
O Lugar da Barra teve outras denominações até a criação da Província do Amazonas quando recebe o nome atual de Cidade de Manaus.
Manaus surge então como lugar estratégico para fomentar e controlar o comércio e sobretudo para a defender a soberania dos portugueses sobre o território amazônico das ameaças de seus concorrentes vindos através do Rio Negro e do Rio Solimões.
Complementando essas afirmações deve-se acrescentar que o Rio Negro por essa época ainda concentrava numerosas nações indígenas, e, nessa área em questão destacavam-se os manaós, os baré, os passé, os tarumâ, os baniua e outras tantas nações indígenas vindas de outros rios que organizadas pelos Carmelitas foram a mão-de-obra utilizada na construção da fortaleza e que interagindo e miscigenando-se com os portugueses e outros mais deram origem ao núcleo populacional do Lugar da Barra, acrescido de um novo seguimento social regional que ficou conhecido como cabocos.
Pela sua localização geográfica, e sobretudo pela presença atuante das missões religiosas e dos funcionários públicos e colonos portugueses o Lugar da Barra, funcionou também como centro de recrutamento, controle e concentração da força de trabalho indígena. Nesse sentido o Lugar da Barra fez parte da logística de apoio às tropas portuguesas que promoviam “as guerras justas”, “os descimentos”, e os “resgates” e que atuaram no Rio Madeira, no Rio Japurá e no Rio Solimões acima chegando até a tríplice fronteira do Peru e Colômbia, sempre com o objetivo de capturar e escravizar os indígenas.
Em sua viagem em 1637 Pedro Teixeira teve oportunidade de verificar a situação dos fortes que tinham sido construídos até aquela data ao longo do Rio Amazonas. Em documento intitulado “Relatório do General Pedro Teixeira do Rio das Amazonas para o Senhor Presidente (Relazion del General Pedro Tejeira deel rio delas Amazonas para el Sor Presidente) Pedro Teixeira observa o seguinte:

 “La segunda Fortaleza, éstá situada en él Curupa Zient leguas de la Ciudade de Velen... ésta Fortaleza de el Curupá, tiene fama no defiende cosa ninguna por estar sobre una gran barranca, és solamente para conservazion delos Indios horros, que por alli zercano viven, y para correr la costa de el cabo del Norte, por donde de contino entran los enemigos a pobiar y comerzear con los âruacas, araguoazis, comaus”. (CORTESÃO, Jaime, 1965).

É certo que estas observações foram consideradas pelas autoridades portuguesas, e, o que se constata historicamente, é que o governo português operou no sentido de dotar as fronteiras com equipamentos necessários para a defesa do território surgindo assim essas estruturas de edificações militares que até hoje asseguram a soberania brasileira sobre a Amazônia.
Constata-se na atualidade que os atuais investimentos feitos na Amazônia obedecem à mesma lógica de mantê-la como região colonial. Os grupos empresariais capitalistas e os empreendedores de sucesso condicionam seus investimentos aos incentivos fiscais.
O Estado continua associado aos interesses privados, bancando a maior parte dos investimentos, transferindo recursos públicos para investidores privados. Tudo feito com a ideologia do desenvolvimento sustentável defendida pelos cientistas que se colocam a serviço da atual expansão capitalista no mundo.
A construção da atual região amazônica resulta, portanto do embate inicial histórico/geográfico entre dois projetos de vida: FELIZ LUSITÂNIA dos portugueses e A TERRA SEM MALES dos indígenas amazônidas, idênticos nas suas concepções pois, ambos buscavam a felicidade, mas completamente diferentes nas práticas e procedimentos para a realização de seus objetivos.
EXPANSÃO DAS ESTRUTURAS MILITARES DA AMAZÔNIA A PARTIR DA FUNDAÇÃO DE BELÉM E MANAUS - O Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo do Presépio de Belém que deu origem ao povoado de Nossa Senhora de Belém do Grão-Pará, posteriormente chamado de Santa Maria de Belém e que na atualidade, é simplesmente Belém, Belém do Pará consolidou-se como base para a expulsão dos concorrentes franceses, ingleses, irlandeses e sobretudo dos holandeses.
Os competidores estrangeiros foram sendo afastados até que em 1633 o Capitão-mor Feliciano Coelho de Carvalho ordena aos capitães Aires de Sousa Chinchorro e Pedro Baião de Abreu atacarem o lendário Forte de Cumaú, artilhado com sete peças de ingleses e holandeses que servia de armazém de drogas do sertão, gêneros alimentícios e de armas e munições.
No dia nove de julho de 1632 o Capitão Pedro Baião com dez soldados e 250 índios flecheiros tucujus, atacam e dominaram o forte de Cumaú.
Em quatorze de julho de 1632 o comandante do forte do Cumaú Roger Fray é abordado pelo capitão Ayres Chinchorro, quando entram em violenta luta resultando na morte de Roger Fray. A partir deste fato os ingleses desistem de suas pretensões sobre a Amazônia.
Afugentados os inimigos e aparelhado o Forte do Castelo, que também ficou conhecido como Forte do Presépio, Belém do Pará se firmou não só como uma base de defesa, mas também como uma base de apoio para a expansão lusitana na Amazônia.
Nesses primeiros momentos o sentido das ações portuguesas na Amazônia visava afastar definitivamente os concorrentes, conhecer os recursos naturais e sobretudo assegurar a posse para uma posterior exploração. Concretamente é um conjunto de ações, como veremos posteriormente, que serão implementadas para garantir a posse e a soberania portuguesa na Amazônia.
Neste sentido de assegurar a posse e a soberania portuguesa sobre a Amazônia segue-se uma sequência de construções de fortificações, fortalezas, fortes, fortins ao longo do Rio Amazonas.
Assim é que em 1623 se implanta a Fortaleza de Santo Antônio de Gurupá que deu origem a cidade de Gurupá.
Em 1638 surge o Forte do Desterro que deu origem a cidade de Monte Alegre.
Em 1697 foi estabelecida a Fortaleza do Tapajós que cria as condições para o desenvolvimento da cidade de Santarém.
Entre os anos de 1698 e 1758 consolidou-se a fortaleza de Pauxis dando origem a cidade de Óbidos.
Foi importante também a construção do Forte Paru, também referido como Forte de Almeirim, localizado à margem esquerda da foz do rio Jenipapo ou rio Paru, afluente da margem esquerda do rio Amazonas, onde se localizava o aldeamento do Paru, fundado por frades capuchos de Santo Antônio, ao qual se uniram os indígenas do rio Uacapari. O governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado elevou o aldeamento do Paru à categoria de Vila com o nome de Almeirim a 22 de fevereiro de 1758.
Em 1770, próximo ao Rio Javari surge o Forte São Francisco Xavier que dará origem a cidade de Tabatinga.



ESTRUTURAS MILITARES NA TRÍPLICE FRONTEIRA
BRASIL, COLÔMBIA E PERU

TABATINGA - Argila sedimentar branca untuosa com certo teor de matéria orgânica, no tupi significa barro branco ou esbranquiçado, de muita viscosidade disponível em grande quantidade nos fundos do rio Solimões e afluentes. No tupi-guarani significa casa pequena. Este recurso natural dá nome a um município do interior do estado do Amazonas na Microrregião do Alto Solimões na tríplice fronteira entre o Brasil, Colômbia e o Peru.
Os historiadores se queixam da falta de documentação primária para reconstruir a história e a geografia de Tabatinga envolta em controvérsias.
Igualmente controversa é a história de Letícia, a cidade colombiana que faz fronteira com Tabatinga É de domínio público que Letícia teria surgido com a morte de fome de exploradores portugueses naquele local do rio. Conta-se que para evitar a cobiça da Colômbia o Peru resolveu colonizar a área encontrando naquele local uma cruz com a inscrição "San Antonio", que deu origem ao primeiro nome da cidade.
Fundada como um porto fluvial a 25 de Abril de 1867 pelo engenheiro peruano Benigno Bustamante com nome de Santo Antônio, em 15 de dezembro do mesmo ano, o engenheiro Manuel Charón mudou o nome para Leticia, em homenagem a uma mulher peruana de Iquitos chamada Leticia Smith. Também pode ter sido uma homenagem a Santa Letícia, dizem outros.
Quanto à Tabatinga no Brasil, a partir de documentação primária publicada em edição fac simile pela Universidade Federal do Amazonas: “Cartas do primeiro Governador da Capitania de São José do Rio Negro Joaquim de Mello e Póvoas 1758-1761 Transcrições Paleográficas” foi possível fundamentar algumas questões.
Na referida publicação consta a Carta Régia com data de 03 de março de 1755, de Dom José I, criando a Capitania de São José do Rio Negro com sede administrativa na boca oriental do Javari, conforme transcrição parcial a seguir:

“Francisco Xavier de Mendonça Furtado, Governador, e Capitão General do Gram Pará e Maranhão, Amigo, Eu El Rei vos envio muito saudar. Tendo consideração ao muito que convém ao serviço de Deos, e meu, e ao bem comum dos meus vassalos moradores nesse Estado, que nélle se augmente o numero dos Fieis alumiados das Leis do Evangelho, pelo próprio meio da multiplicação das Povoações civis e decorosas: para que atrahindo a si os Racionais, que vivem nos vastos sertões do mesmo Estado separados da Nossa Santa Fé Catholica, e até dos dictames da mesma Natureza: E achando alguns délles na observância das Leis Divinas, e humanas, socorro e descanço temporal e eterno sirvão de estimimulo aos mais que ficarem nos mattos, para que imitando tão sudaveis exemplos, busquem os mesmos benefícios: e attendendo a que aquella necessária observancia de leis, senão conseguirá para produzir tão uteis efeitos se a vastidão do mesmo Estado que tanto difficulta os recursos ás duas capitães do Gram Para e de São Luiz do Maranhão senão se subdividissem em mais alguns Governos a que as partes possam requerer para conseguirem que se lhes administre justiça com maior brevidade, e sem a vexação de serem obrigados a fazer tão longas, e penosas viagens, como agora fazem. Tenho resoluto estabelecer um terceiro governo nos confins ocidentais désse Estado, cujo chefe será denominado Governador da Capitania de São José do Rio Negro.
[...] Para residência do mesmo Governador Sou servido mandar erigir logo em Villa a Aldêa que mandei novamente estabelecer entre a boca Oriental do Rio Javary, e a Aldêa de São Pedro, que administrão os religiosos de Nossa Senhora do Monte do Carmo”. (UNIVERSIDADE DO AMAZONAS. CEDEAM. Cartas do Primeiro Governador da Capitania de São José do Rio Negro. Joaquim de Mello e Póvoas – 1758- 1761. p. 69, 1983).
Em outro documento constante da publicação citada anteriormente intitulado “Registro da Patente de Coronel dada a Joaquim de Mello e Póvoas, Governador da Capitania de São José do Rio Negro” de 14 de julho de 1757 Dom José I “cria de novo o Governo de São José do Javari e atendendo a qualidade, merecimentos e serviços que concorrem na pessoa de Joaquim de Mello e Póvoas, hei por bem nomealo Coronel Governador da mesma Capitania”. (UNIVERSIDADE DO AMAZONAS. CEDEAM. Cartas do Primeiro Governador da Capitania de São José do Rio Negro. Joaquim de Mello e Póvoas – 1758- 1761. p. 81, 1983).

Um outro documento que esclarece a consolidação da sede da Capitania de São José do Rio Negro é a carta de Joaquim de Mello e Póvoas narrando a viagem que fez juntamente com Francisco Xavier de Mendonça Furtado governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão e de sua chegada ao arraial do Rio Negro, e a sua posse na Villa de Barcellos, carta com data de 4 de julho de 1758.
Existem outros documentos que tratam de questões relativas a Capitania de São José do Rio Negro mencionando equivocadamente São José do Javari. Como já mencionamos anteriormente a própria Carta Régia de 03 de março de 1755 que cria a Capitania de São José do Rio Negro diz expressamente: “Para residência do mesmo Governador sou servido mandar erigir logo em Villa a Aldea de que mandei novamente estabelecer entre a boca Oriental do Rio Javari e a aldêa de São Pedro, que administrão os religiosos de Nossa Senhora do Monte do Carmo”.
O fato histórico concreto é que o governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão dá posse ao primeiro governador da Capitania de São José do Rio Negro na antiga aldeia de Mariuá que passou a condição de “Villa de Barcellos”.
É possível admitir que o governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão do Marquês de Pombal levou em consideração as ponderações a respeito deste assunto, constantes na carta que lhe foi dirigida pelo Frei Miguel de Bulhões, datada de 13 de maio de 1755:

“A capital deve ser fundada no meyo do mesmo governo; a aldeia, com seus edifícios, está pronta, sem necessidade de gastar mais tempo ou dinheiro; o Javari pela imensa praga que tem, é indigno de ser moradia perpétua de um governador, ao contrário do Rio Negro; estando os governadores aí, poderão acudir e socorrer todas as povoações; podem difilcultar o comtrabando de índios; e a sétima finalmente porque atendendo a comunidade do sítio achará S.Mag. vassalos que o sirvão nesse governo com gosto, honra e préstimo, o que talves, ficando ele estabelecido no Javari, antes pela inclemência da praga ficará reputado o tal governo,  como o de Cabo Verde e S. Thomé”. (Cf. J. Nabuco. Documentos de Origem Portugueza.Vol 1. P. 78-80).

Não foi descoberto até a presente data (2017) documentação que explique essa mudança tão importante contrariando ao que consta na Carta Régia de 03 de março de 1755.
Na verdade, a Vila de Mariuá, segundo o historiador amazonense Artur Reis já vinha recebendo várias benfeitorias para abrigar as comissões espanholas instituídas pelo Tratado de Madri de 1750 que se uniriam às comissões portuguesas para definirem as fronteiras entre estes dois reinos aqui na Amazônia.
Novas ruas foram abertas; uma grande praça foi construída e uma plataforma para acostamento de barcos e para embarque e desembarque de passageiros; e, complementando estas providências foi construído também um armazém. Do mesmo modo a igreja e o seminário dos carmelitas receberam benfeitorias. Foram construídas casas para abrigar os familiares dos membros das comissões além de três quartéis.
Observamos que a providência de Francisco Xavier de Mendonça Furtado (Foto ao lado) de elevar à condição de Villa a Aldeia de São Francisco Xavier do Javari evidenciam a consolidação de um novo ordenamento na defesa da Amazônia Ocidental tendo como bases estratégicas: Barcellos, São José da Barra do Rio Negro (Manaus), Saracá (Silves) Serpa (Itacoatiara), Ega (Tefé), São José do Javari no Solimões, Borba (Trocano), Príncipe da Beira e Vila Bela do Mato Grosso.
Foi no ano de 1766 que o Governador do Grão-Pará e Maranhão, o Capitão General Fernão da Costa de Ataíde Teive Sousa Coutinho mandou organizar um Posto de Inspeção das embarcações que faziam comércio com o povoado espanhol de San Pablo de Loreto no Peru. Um destacamento militar do Rio Javari foi movimentado para constituir um Posto de Guarda de Fronteira ao lado de uma aldeia construída por jesuítas, provavelmente, em 1710, segundo registrou Antônio Porro em “As Crônicas do Rio Amazonas”. O Forte foi desativado em 1889. Voltando a ser a ser reativado em 1910, quando novamente tropas regulares voltaram a assumir esse posto, agora com o nome de Contingente Especial de Tabatinga.
O desenvolvimento das relações econômicas e sociais com a povoação de San Pablo de Loreto, do Peru, deu origem a várias povoações entre as quais se destacaram Vila Ipiranga e Vila Bitencourt. A povoação de São Francisco Xavier de Tabatinga foi a que mais prosperou e se desenvolveu de tal modo que passados dez anos, em 1776 o Governador da Capitania de São José do Rio Negro, Coronel Joaquim de Melo e Póvoas ordena ao Sargento-mor Domingos Franco iniciar a construção do Forte de São Francisco Xavier de Tabatinga.
A Tabatinga atual, está localizada no meio da selva amazônica, à margem esquerda do Rio Solimões faz fronteira com a Colômbia e o Peru. Possui uma área de 3.239,3 km². Além do Rio Solimões, Tabatinga é banhada pelos rios, Içá, Japurá e vários de seus afluentes, tais como: Hapapóris, Traíra, Puretê, Puruê e Cunha. Há duas grandes ilhas fluviais próximas a cidade: Santa Rosa - Peru e Aramaçá. Praticamente os rios continuam sendo as vias de maior utilização para movimentação das pessoas e de mercadorias.
DE POSTO DE GUARDA DE FRONTEIRA A COMANDO DE FRONTEIRA DO SOLIMÕES - Após sua fundação o Forte São Francisco Xavier de Tabatinga, passou a exercer todas as suas funções: evitar as invasões dos espanhóis no território luso-brasileiro, combater o comércio ilícito das drogas do sertão, evitar a presença dos missionários jesuítas a serviço do Rei da Espanha, marcar os limites e assegurar a soberania luso-brasileira naquelas fronteiras.
O Forte de São Francisco Xavier de Tabatinga foi desativado em 1889 voltando a ser reativado em 1910 quando tropas regulares voltaram a assumir esse posto, agora com o nome de Contingente Especial de Tabatinga.
Em 1933, por conta da mediação do Brasil na questão entre Colômbia e Peru pela posse do território do departamento de Amazonas da Colômbia cuja capital é Letícia ocorreu uma grande concentração de tropa, com a presença do 21° Batalhão de Caçadores (BC), do 23° BC, do 27° BC e, ainda, de tropas de Artilharia de Natal e do Cruzador São Paulo. Em 1934, foi celebrado um tratado entre a Colômbia e o Peru, que deu a soberania colombiana sobre aquele território.
Em 1949, o Forte foi transformado em 5° Pelotão de Fronteira. Em 1967, foi criada a Colônia Militar de Tabatinga.
Em 1969, foi criado o Comando de Fronteira Solimões/1° Batalhão Especial de Fronteira.
Em 1992, foi criado o atual Comando de Fronteira Solimões/8° Batalhão de Infantaria de Selva - CFSol/8° BIS.
Em 27 de julho de 1983, de acordo com a Lei Complementar Nº 284/85, aprovada pelo Congresso Nacional, foi criado o Município de Tabatinga, extinguindo-se a Colônia Militar.
O atual status político de Tabatinga resulta de longa luta política de seus cidadãos comprometidos com o crescimento e desenvolvimento de seu torrão natal.
O 8º BIS está subordinado à 16ª Brigada de Infantaria de Selva, localizada em Tefé tem sob sua responsabilidade uma faixa de fronteira de 1.632 km, onde estão instalados quatro Pelotões Especiais de Fronteira (PEF). Ao norte, nas proximidades de La Pedrera, na Colômbia, está instalado na entrada do rio Japurá o 3º PEF – Vila Bittencourt. Logo abaixo, na embocadura do rio Içá está localizado o 2º PEF – Ipiranga. Na fronteira com o Peru, às margens do rio Javari, estão o 1º PEF – Palmeiras do Javari e o 4º PEF – Estirão do Equador.
Destacamos que esta unidade militar, CFSol/8° BIS já registra nos anais de sua história uma página marcada pelo heroísmo de seus soldados.
Em fevereiro de 1991 ocorreu um grande ataque das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Farc ao Brasil, quando 40 guerrilheiros autodenominados Comando Simão Bolívar - Facção Força e Paz invadiram o Destacamento do Traíra do Pelotão Especial de Vila Bittencourt baseado às margens do Rio Traíra, roubando uma grande quantidade de fuzis, metralhadoras e munição, mataram ainda três soldados brasileiros e deixaram 29 feridos.
O presidente do Brasil autorizou revide e o Exército Brasileiro recuperou parte das armas. Os três Infantes de Selva que tombaram no cumprimento do dever de defender a soberania brasileira na Amazônia são: Sd Sansão Ramos Gonçalves, Sd Aldemir Lopes de Oliveira e Sd Sidimar Fonseca Moraes, confirmando e reafirmando a disposição e o ânimo de nossos ancestrais na defesa e proteção de nossa integridade territorial. A partir desse episódio as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia não voltaram mais a atacar.
O Forte de São Francisco Xavier de Tabatinga está na base das estruturas militares que deram início a defesa do atual território brasileiro no alto Solimões. Os fortes coloniais, mutatis mutandis, não diferem dos objetivos da implantação dos atuais Pelotões Especiais de Fronteira. asseguraram e asseguram a
“Consolidação do território conquistado, a exploração econômica da região e o domínio dos direitos de navegação na bacia do Rio Amazonas. Para Portugal conquistar a soberania dessas novas fronteiras, foi primordial a sua ocupação por militares, exploradores e religiosos. Como exemplo bem-sucedido dessa iniciativa, temos a Fortaleza de São José da Barra do Rio Negro, criada em 1669, no local onde atualmente situa-se a cidade de Manaus.(Gal.G.Theophilo.https://www.facebook.com/GeneralExercitoTheophilo/posts/1684438255175296).
OS PELOTÕES ESPECIAIS DE FRONTEIRA (PEF) - Dispor unidades militares estrategicamente ao longo de um grande território, para o exercício do poder, é uma prática que remonta aos romanos. Após anos de conquistas foi necessário transformar as legiões romanas em tropas permanentes e fixadas em posições que possibilitassem defender o território, controlar as pessoas e as atividades políticas, sociais e econômicas que se desenvolveram no grande Império Romano.
É interessante observar que com as ameaças das invasões dos bárbaros o Imperador Diocleciano organizou o exército Romano em: “Unidades de Fronteira” e “Unidades de Campo”. Estas “Unidades de Campo” eram constituídas por soldados bem treinados e bem armados podendo deslocar-se rapidamente para qualquer parte do território onde fosse necessário para cumprir missões ofensivas ou defensivas.
Segundo o General Guilherme Theophilo “... o aperfeiçoamento das doutrinas de defesa, aliadas às novas realidades socioeconômicas e tecnológicas, permitiu a evolução das antigas fortalezas do século XVII para os atuais Pelotões Especiais de Fronteira (PEF)”.
Os atuais Pelotões Especiais de Fronteira, nas palavras do General Guilherme Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, ex-comandante militar da Amazônia têm a nobre e heroica missão de defender nossos limites das diversas ameaças, que se apresentam todos os dias. Além de representar o Estado Brasileiro nas comunidades onde estão instalados, essas tropas contribuem para o desenvolvimento e povoamento dessas regiões.
Estas são as missões do Comando de Fronteira Solimões/8° Batalhão de Infantaria de Selva:
- Manter a presença;
- Exercer a vigilância;
- Proporcionar o alerta oportuno.

Vida, Combate e Trabalho são os alicerces a partir dos quais se constrói a vida em um Pelotão Especial de Fronteira. É a chamada tríade da soberania que gera proteção, desenvolvimento sustentável e cidadania.
A Vida de um Pelotão Especial de Fronteira (PEF) é semelhante à das outras Unidades do Exército: atividades administrativas, serviço de escala, solenidades cívico-militares, hasteamento da Bandeira Nacional, canto do hino nacional, instruções, treinamentos etc.
Do ponto de vista estritamente militar, o Combate, o Pelotão Especial de Fronteira deve assegurar a integridade e o bem-estar dos integrantes do Pelotão e das comunidades vizinhas. Além disso são responsáveis por vigiar toda a extensão da fronteira; identificar os pontos e vias de acesso; dar a primeira resposta a qualquer ameaça à integridade do País. Se for necessário, os pelotões podem receber reforço militar de todo o país em menos de 14 horas.
O Pelotão Especial de Fronteira exerce também funções de polícia denunciando às autoridades competentes ocorrência de práticas ilícitas; controlando embarcações que navegam nos rios dentro de sua área; coibindo a passagem de produtos ilícitos e crimes contra a flora e a fauna na faixa de fronteira; realizando intenso patrulhamento em suas áreas e estabelecendo, postos de bloqueio e controle de vias fluviais.
Em muitos casos, os Pelotões Especiais de Fronteira são a única presença do Estado Brasileiro naqueles locais isolados e esquecidos do nosso país o que leva os Pelotões Especiais de Fronteira exercerem também funções supletivas em virtude da grande carência de recursos e de serviços do Estado.
Nesse sentido as estruturas militares existentes são abertas também ao atendimento da comunidade civil na área de saúde, educação, atividades sociais, esportivas, de lazer. Para a execução das tarefas referentes ao TRABALHO, o PEF possui uma infraestrutura que abarca algumas das seguintes atividades: serralheria, carpintaria, oficinas de manutenção; além de dispor de equipamentos de eletricista, bombeiro, carpinteiro e pedreiro. São estas atividades que constituem o Trabalho de um Pelotão Especial de Fronteira etc.
Essas atividades tem um momento especial quando da realização da conhecida Operação Aciso, (Operação Cívico Social) na qual o Pelotão Especial de Fronteira planeja, lidera, coordena e participa efetivamente de ações e serviços de saúde, educação e etc....em benefício da comunidade local.
Estas ações e serviços consistem em: atendimento médico, odontológico, distribuição gratuita de medicamentos. Atendimento de cidadania fornecendo registro de nascimento, carteira de identidade, carteira de trabalho. São feitas também atividades culturais, esportivas, de lazer e outras mais.
Todas estas atividades obedecem aos princípios norteadores do Manual de Ações Comunitárias do Exército Brasileiro. Segundo esses princípios os participantes da Operação Aciso devem manter a tradição humanitária do Exército Brasileiro nas suas relações com a população respeitando as tradições e cultura locais; procurando a colaboração das lideranças; evitando paternalismos e preparando os beneficiários para dar continuidade da participação da comunidade nos momentos necessários.
Todas estas atividades do Exército Brasileiro são amparadas pela lei complementar Nº 97 de 09 de junho de 1999, que dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas. Nas ATRIBUIÇÕES SUBSIDIÁRIAS consta: Cabe às Forças Armadas, como atribuição subsidiária geral, cooperar com o desenvolvimento nacional e a defesa civil.
O General de Exército Guilherme Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, comandante militar da Amazônia atualiza o novo sentido para aqueles que atualmente vêm servir na Amazônia: “Tenho a certeza de que servir a Amazônia é um privilégio, e lutar pelo seu desenvolvimento sustentável é uma obrigação”.
O testemunho daqueles que têm vindo servir nas fronteiras seguem o mesmo sentimento do General Theophilo Gaspar de Oliveira. Na verdade, servir na fronteira requer uma formação e treinamentos específicos que são passados nas unidades em que os militares servem.

A Tenente Médica Raquel Lanna, do 4º Pelotão Especial de Fronteira, fala sobre as missões dos militares e sobre o estágio de adaptação de vida na selva.

Todos os oficiais de saúde eles quando chegam na região de selva eles recebem um treinamento que é o EAS, Estágio de Adaptação e Serviço. Então, são dois meses que a gente passa na unidade dentro da unidade do posto médico em Rio Branco aprendendo toda a ordem unida. Aprendendo como marchar, como prestar continência corretamente e no fim desse estágio de adaptação ao serviço a gente passa pelo EAVS (Estágio de Adaptação à Vida na Selva). E é nesse estágio que a gente aprende todas as regras básicas da sobrevivência na selva. [...] Então depois desses dois meses de treinamento agente deixa finalmente a nossa vida civil e veste de uma vez por todas a farda verde oliva e passa a incorporar esses ensinamentos na vida prática da gente. (https://www.youtube.com/watch?v=12exFKXaUBo).
A Tenente Médica Raquel Lanna fala de sua experiência no 4º Pelotão Especial de Fronteira (Santa Rosa do Purus/AC), do Comando de Fronteira Acre/4° Batalhão de Infantaria de Selva, mas o relato dela não é diferente do que se passa nos outros pelotões de fronteira e as exigências são iguais para todos os militares de todas armas e serviços:

O EAVS, que é o Estágio de Adaptação à Vida na Selva a gente passa acampado uma semana recebendo instruções dentro de um ambiente de selva mesmo e no fim desse treinamento a gente passa por pelo menos um dia de sobrevivência onde não fornecem alimentos pra gente, onde a gente tem que construir o nosso próprio acampamento e aí a gente constrói a nossa cama de mato e pedaços de madeira , a gente tem que construir um abrigo pra poucos que a gente chama de rabo de jacu, esse tipo de construção, e aí a gente tem que bater várias gaivotas. São várias missões que são necessárias em um ambiente de selva mesmo. No caso por exemplo, uma aeronave caiu, no caso de uma missão de selva que a gente fique sem receber suprimentos , que a gente perca o nosso equipamento então a gente tem pelo menos alguma chance de realmente sobreviver. (https://www.youtube.com/watch?v=12exFKXaUBo).

Atualmente na tríplice fronteira, Brasil, Colômbia e Peru, o CFSol/8° BIS enquadra quatro Pelotões Especiais de Fronteira (PEF):
1° PEF – Palmeiras do Javari, às margens do rio Javari;
2° PEF – Ipiranga, às margens do rio Içá;
3° PEF – Vila Bittencourt, às margens do rio Japurá;
4° PEF – Estirão do Equador, às margens do rio Javari.
Estes Pelotões especiais de Fronteira defrontam-se e enfrentam a biopirataria, garimpo ilegal, crimes ambientais e o plantio e tráfico internacional de drogas.
Todas essas atividades são desenvolvidas aproveitando ao máximo a malha hidroviária, por isso todo transporte é feito através dos rios, ou aeromóveis, com o apoio da Força Aérea Brasileira e ou do 4º Batalhão de Aviação do Exército por isso é importante que o combatente esteja habilitado a realizar deslocamentos nadando, e a operar embarcações com motores de popa e barcos a remo.
O Combatente de Selva nas fronteiras da Amazônia, ainda tem de enfrentar as doenças tropicais pois o clima quente e úmido da região é propício à infecção por fungos e bactérias. Este singular teatro de operações é uma área endêmica de tuberculose, leishmaniose e malária. Por isso, o militar deve estar com a saúde em muito bom estado. O 8º BIS está dotado com equipamento padrão do Exército Brasileiro, mas com as adequações necessárias à utilização no Teatro de Operações da Amazônia.
Como armamento utiliza-se o fuzil Para-FAL 7,62, o Fuzil Automático Pesado, metralhadoras MAG 7,62 e Ponto 50. Estas últimas podem ser instaladas em suportes existentes nas embarcações, o que dará um poder de combate maior durante uma abordagem ou desembarque ribeirinho permitindo-lhe movimentos de pontaria, limitando-lhe o recuo e facilitando-lhe o transporte.
Uma novidade incorporada às operações de selva é a utilização do búfalo como meio de transporte. O animal tem facilidade para atravessar rios, tendo capacidade de subir aclives carregando uma carga de munição e armamento de até 400 kg. Em ambiente de selva ele se alimenta de quaisquer folhas e em combate fica tranquilo e não se assusta como outros animais, sendo o único meio de transporte usado pelas tropas atualmente.
O 1° PEF – Palmeiras do Javari, às margens do rio Javari tem suas origens ligada uma vila formada por seringueiros, Palmeiras do Javari que surge a partir de 1940. O rio Javari navegável o ano inteiro se apresenta como uma grande via de entrada para o Brasil. Era preciso implantar uma fiscalização nessa faixa de fronteira.
Em 1º de setembro de 1955, o decreto nº 38.318, criou o 8º Pel Fron (futuro 1° PFF).
Com a finalidade de escolher o local para instalação do 8° Pelotão de Fronteira, foi organizada a Operação Palmeiras do Javari, em 1961, deu-se- a presença militar no local onde é atualmente o 1° Pelotão Especial de Fronteira.
A proximidade com a cidade peruana de Colônia Angamos e a comunidade existente no local, criou as condições para que o Seringal Palmeiras fosse escolhido para a instalação do 1º PEF. Em janeiro de 1963, as obras foram iniciadas e incorporado o primeiro contingente, e o Seringal Palmeiras do Javari localizado às margens do Rio Javari emprestou seu nome ao 8º Pelotão de Fronteira, criado em 1995, por meio do Decreto nº 38.318.
O rio Javari, que serve de divisa entre Brasil e Peru é um afluente do Rio Solimões, nasce na Serra do Contamana no Peru. Sua extensão é de cerca de 1.180 km. O território a partir da margem direita pertence ao Brasil, onde encontramos os Pelotões Especiais de Fronteira do Exército Brasileiro de Palmeiras do Javari e Estirão do Equador e os municípios do Estado do Amazonas de Atalaia do Norte e Benjamin Constant.
Nas suas nascentes o Rio Javari chama-se rio Jaquirana até a confluência com o Rio Bara, a partir de onde recebe o nome de Javari. O Rio Javari tem sua foz no município de Atalaia do Norte onde tem três braços formados por duas ilhas, Islândia e Petrópolis.
O 2° PEF – Ipiranga, às margens do rio Içá, na calha do Rio Solimões, tem suas origens a partir de um pelotão destacado do Vigésimo Sétimo Batalhão de Caçadores, o 27 BC, em 1934, cujas tradições foram herdadas pelo Primeiro Batalhão de Infantaria de Selva sediado em Manaus. O Pelotão instalou-se na localidade de Vila Nova do Tonantins, atual cidade de Tonantins.
Posteriormente este pelotão foi transferido para a Comarca de Santo Antônio de Içá passando a denominar-se Pelotão Içá. Em l952, por razões estratégicas este pelotão foi removido para o Rio Içá. Em 1956 suas instalações foram concluídas e recebeu o nome de Pelotão Especial de Fronteira. O Pelotão recebeu o nome de IPIRANGA, por sugestão do Cel Inf José Moacir Orestes de Salvo Castro, que foi comandante do Comando de Elementos de Fronteira (CEF).
O 3° PEF – Vila Bittencourt, às margens do rio Japurá, também tem sua área envolvida em estórias que dizem ter sido esta região utilizada pelos incas em suas viagens pela região amazônica usando-a para se abastecerem com culturas de curta duração.
Historicamente consta que com o início da Segunda Guerra Mundial foram criados os pelotões de Içá na cidade de Santo Antônio de Içá e o Pelotão Japurá na cidade do mesmo nome.
Em 1942, o 30 PEF foi transferido com o nome de Pelotão Japurá para Vila Bittencourt, uma comunidade surgida nos anos 50 a partir da exploração de ouro na região.
Com a criação dos Grupos de Elementos de Fronteira (GEF) em 1950, em 1969 o pelotão passa a ser subordinado ao CFSol/1º BEF, atual CFSol/8º BIS e em homenagem ao militar que fixou os marcos na região passa a denominar-se 3° PEF – Vila Bittencourt.
4° PEF – Estirão do Equador, às margens do rio Javari. Estirão do Equador foi uma comunidade que surgiu por volta de 1950 com o nome de Seringal Brasil por causa da grande concentração de seringueiros na área.
Posteriormente por causa de um igarapé chamado Equador e pelo fato de que em frente ao pelotão o Rio Javari apresentar um longo trecho retilíneo chamado de estirão, o território da comunidade que ali se desenvolveu ficou conhecido como Estirão do Equador. O agravamento dos conflitos entre “brancos”, seringueiros e as comunidades indígenas provocou o abandono da área pelos seringueiros.
Para iniciar o processo de colonização desta área e de guarnecer a linha de fronteiras foi criado o 9º Pelotão de Fronteiras, o 9º Pel Fron.
Criando-se em 10 de janeiro de 1969 o 1º Batalhão Especial de Fronteira com sede em Tabatinga-AM, o 9º Pelotão de Fronteiras passa a ser a 1ª Companhia Especial de Fronteira (1ª CEF), formada pelos pelotões de Japurá, Ipiranga e Palmeiras do Javari.
A 1ª Companhia Especial de Fronteira (1ª CEF), em fevereiro de 1986, transferiu seu posto de comando (PC) para o 1º BEF, em Tabatinga.
Com esses quatro Pelotões Especiais de Fronteira, nas condições acima descritas, o Exército Brasileiro através do CFSol/8º BIS guarnece 1.632 quilômetros da nossa fronteira amazônica. Daí o paradigmático lema:

“MARCAMOS OS LIMITES DA PÁTRIA. HÁ QUE SER FORTE!”.


Conclusão - Os Pelotões Especiais de Fronteira são a força mais avançada que os brasileiros dispõem na defesa de sua integridade territorial, não apenas dão o primeiro combate aos inimigos e malfeitores da convivência social, mas são ainda os pioneiros no fomento da educação, da saúde da segurança enfim, ...da cidadania soberana dos brasileiros sobre seu território na Amazônia.
Demonstramos que unidades militares dispostas ao longo de um grande território, para o exercício da soberania como: assegurar a posse, cobrar impostos, exercer a justiça etc. etc... é uma prática que remonta aos romanos. Os portugueses, no período colonial, usaram-na com muito êxito aqui no Brasil assentando as bases da soberania luso-brasileira nos territórios conquistados.
Como exemplificamos, particularmente na Amazônia, a maioria das cidades se originou a partir de fortes cujos os exemplos mais expressivos e conhecidos são Belém, no Pará e Manaus no Amazonas que se desenvolveram a partir do Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo do Presépio de Belém e do Forte São José da Barra do Rio Negro respectivamente.
Historicamente no Brasil, particularmente na Amazônia, está comprovado que os Pelotões Especiais de Fronteira são a melhor tecnologia de geoestratégia militar para a defesa da sua integridade territorial.
Também está provado que do ponto de vista geopolítico estas unidades militares, os Pelotões Especiais de Fronteira, atualmente, são a tecnologia mais adequada para unir militares e civis, soldados e paisanos, homens e mulheres, brancos, negros e indígenas no exercício da cidadania sobre o território da Amazônia rumo ao desenvolvimento sustentável do Brasil.
No Brasil é necessário ainda resgatar e destacar a participação das tribos indígenas na preservação de sua soberania sobre seu território. Desde os primórdios das lutas contra os invasores franceses, holandeses e ingleses.
Nas lutas mais importantes na defesa do atual território brasileiro os guerreiros indígenas estiveram sempre presentes com seus arcos, flechas e tacapes e ombreados com soldados luso-brasileiros com seus arcabuzes ou mosquetes defenderam a integridade territorial do Brasil.
Assim é que na tentativa dos franceses de fundarem a França Antártica no Rio de Janeiro comandados pelo almirante Nicolas Villegaignon; na expulsão dos franceses de São Luís, que queriam implantar a França Equinocial sob o comando do capitão de marinha Daniel de La Touche o apoio dos índios foi decisivo para a vitória sobre os invasores.
Quanto aos ingleses já vimos que em julho de 1632 o Capitão Pedro Baião com dez soldados e 250 índios flecheiros tucujus, atacaram e dominaram o forte de Cumaú e que a partir deste fato os ingleses desistem de suas pretensões sobre a Amazônia.
Deve-se enfatizar ainda que o braço forte das nações indígenas também esteve presente e teve uma participação significativa e decisiva nas batalhas que se sucederam naquilo que hoje é considerado “o terço sagrado do nosso exército e da nacionalidade brasileira”, Guararapes. (1648/1654).
No dispositivo das tropas que defendiam o território luso brasileiro nos Montes Guararapes “O flanco direito era protegido pelo terço (ou grupamento) do índio Felipe Camarão, oculto na restinga de mato existente dentro dos alagados”. Este grupamento comandado pelo índio Felipe Camarão também atuou pelo flanco esquerdo. “O flanco esquerdo holandês, atolado nos alagados, foi totalmente destruído pelos índios de Felipe Camarão”. (http://www.7rm7de.eb.mil.br/index.php/batalha-dos-guararapes).
Não se pode apagar ou desconsiderar na história que a luta pela defesa da Amazônia para o Brasil teve início com o Cacique Ajuricaba e seus guerreiros manaós aliados às demais nações indígenas que viviam aqui pelo Rio Negro.
Na Amazônia, a construção das estruturas militares, civis e religiosas que permitiram a formação e funcionamento da sociedade regional amazônica atual tem a forte participação das nações indígenas. Relembremos apenas a construção dos fortes que deram origem as duas mais importantes cidades da Amazônia brasileira Belém e Manaus.
 Fortalezas, fortes, fortins, quarteis, portos, palácios, Igrejas, conventos, e etc.… não sairiam dos projetos sem o apoio efetivo, firme e forte da mão-de-obra indígena.
Deve-se ressaltar a fundamental e decisiva participação indígena na Expedição Pedro Teixeira que definiu as fronteiras do Brasil na Amazônia cuja área passou a representar 50% do território brasileiro. Sem o apoio logístico dos 1200 índios que participaram de sua expedição, cumprindo as mais diversas tarefas para o êxito da expedição, Pedro Teixeira jamais teria atravessado sequer a Baía do Guajará. Essas são algumas dívidas que precisam ser resgatadas pelo Estado Brasileiro para com as nações indígenas do Brasil e da Amazônia.
Podemos afirmar que as estruturas militares na Amazônia começam a ser construídas a partir da chegada de Francisco Caldeira Castelo Branco a baía do Guajará em 12 de janeiro de 1616 acompanhado de três embarcações e uns duzentos homens.
Saídos que foram do Maranhão em 25 de dezembro de 1615, ainda sob a influência das festas natalinas, à margem esquerda do igarapé Piri construíram seus alojamentos com pedaços de paus e cobertos com palhas e artilharam o local com doze peças o que ficou conhecido como: Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo do presépio de Belém.
Como demonstramos, o Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo do Presépio de Belém foi o primeiro de uma série de outras edificações militares que se sucederam no tempo defendendo e desenvolvendo a Amazônia até as instalações atuais do CMA.
A presença dos militares nas unidades de fronteira, desde os tempos coloniais, deram aos militares que ali servem uma experiência que foi passando de gerações em gerações e foi se acumulando de tal forma que atualmente o Comando Militar da Amazônia é detentor não só dessa experiência de vida como também de conhecimentos que lhe permite pensar e planejar as estratégias mais eficientes para a defesa das fronteiras e para o desenvolvimento do território.
A instabilidade política dos países fronteiriços; o crescimento extraordinário de atividades ilícitas de toda natureza e inclusive crimes ambientais; o descaso dos sucessivos governos com a assistência socieconômica e cultural às populações das cidades fronteiriças que leva estas populações a buscar apoio nas organizações criminosas e os conflitos e questões não resolvidos com as nações indígenas pedem uma atuação mais resoluta da assessoria parlamentar do Ministério da Defesa na busca de apoio dos outros ministérios em promover programas e projetos que levem a melhoria da qualidade de vida e a geração de renda dos cidadãos e das cidadãs das cidades fronteiriças, deixando ao Ministério da Defesa aplicar seus recursos para os seus fins constitucionais específicos.
Trará grandes consequências benéficas para as populações das cidades fronteiriças a transferência para a Amazônia Ocidental da Comissão Brasileira Demarcadora de Limites, sediada em Belém e da Sede da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, OTCA, sediada em Brasília.
Temos consciência histórica e geográfica da luta, dos sacrifícios e da  determinação de nossos ancestrais, na manutenção da soberania do Brasil sobre a Amazônia. Às gerações atuais cabe a obrigação de lutar para o desenvolvimento do País das Amazonas como queriam os nossos antepassados cabanos: livre, justo, soberano e feliz.



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Gal.G.Theophilo.https://www.facebook.com/GeneralExercitoTheophilo/posts/1684438255175296.




https://www.youtube.com/watch?v=12exFKXaUBo




(Anexo)
MISSÕES DOS PELOTÕES ESPECIAIS DE FRONTEIRA



1ª Tenente Médica Raquel Lanna, do 4º Pelotão Especial de Fronteira (Santa Rosa do Purus/AC), do Comando de Fronteira Acre/4° Batalhão de Infantaria de Selva).


A função dos Pelotões Especiais de Fronteira é justamente manter as nossas fronteiras. Nós temos que estar presentes e verificar se não tem nenhum tipo de ocupação estrangeira; se não estar virando uma rota de tráfico de Drogas. A gente tem que ver se crimes ambientais não estão sendo praticados. Então, todos os pelotões têm os marcos de fronteira a bater ao longo do ano.
Geralmente são de dez a doze missões de reconhecimento de fronteiras, divididos entre os três grupos de combate de cada pelotão.

Durante o curso de EAS a gente aprende as coisas, as táticas básicas militares como manusear uma pistola, como a gente deve se portar dentro de uma missão.... Então depois desses dois meses de treinamento agente deixa finalmente a nossa vida civil e veste de uma vez por todas a farda verde oliva e passa a incorporar esses ensinamentos na vida prática da gente.

São várias missões que são necessárias em um ambiente de selva mesmo. No caso por exemplo, uma aeronave caiu, no caso de uma missão de selva que a gente fique sem receber suprimentos, que a gente perca o nosso equipamento então a gente tem pelo menos alguma chance de realmente sobreviver.

Entre as gaivotas a gente tem é o grupo da água. Então nós temos que encontrar um curso de água e dentro desse curso de água a gente tem que sinalizar qual vai ser a água usada para fazer os alimentos, qual será a água usada pra banho, qual será a água usada para excrementos, no caso pra lavar os objetos de cozinha.
Então, em primeiro lugar a gente tem que retirar a água que vai ser pros alimentos e aí em segundo lugar pra poder lavar os utensílios e em terceiro lugar a água para banhos.
Aí a gente tem que bater a gaivota do fogo que é construir o rabo de jacu, fazer o fogo e manter o fogo aceso, porque a noite na selva um dos grandes riscos é você acabar virando presa de um animal no topo da cadeia alimentar, no caso. Então o fogo tem essa função que além de secar a roupa da gente, geralmente está úmida pela caminhada durante o dia tem a função também de afugentar esse tipo de animal.
O curso durou uma semana e aí no último dia é como se fosse a nossa prova, que realmente eles colocam a gente sem equipamentos ou com equipamento mínimo dentro de um ambiente de selva e a gente tem que executar estas funções.
Apresentação da Rede de Selva
Essa é a nossa rede de selva padrão utilizada na região amazônica pelo Exército Brasileiro. Ela é composta pelo telheiro que serve par proteger a gente da chuva. Esse é o mosquiteiro que geralmente ele sempre vem acoplado a estrutura principal da rede, e aqui é a rede propriamente dita, que geralmente vem com esse bolso reserva aqui em baixo que é bastante útil pra gente poder guardar certos equipamentos como coturno por exemplo e roupa de muda.
Apresentação do Cinto Suspensório Operacional
Este é o nosso cinto suspensório operacional. Então a gente costuma usar ele em todos os eventos cerimoniais e também durante as missões de selva. Aqui na região amazônica ele é composto pelo facão que é muito útil na hora de agente abrir o caminho no meio da selva. No meu caso que sou oficial de saúde eu uso uma pistola, enquanto os oficiais de infantaria eles portam a pistola e o fuzil. E dois cantis com a capacidade de um litro cada. Esse é o cantil. (https://www.youtube.com/watch?v=12exFKXaUBo).

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